sábado, 24 de dezembro de 2011

OPERAÇÃO CASTELO DE AREIA: TRF-3 ANULA SENTENÇA DO JUIZ FAUSTO DE SANCTIS

A operação castelo de areia, da Polícia Federal, que apurou suposto esquema de desvio de verbas públicas, evasão de divisas e lavagem de dinheiro pela construtora Camargo Correia, rendeu mais uma reprimenda ao agora desembargador federal Fausto Martin de Sanctis por sua atuação. Desta vez por seus colegas do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Por unanimidade, a 2ª Turma do TRF-3 decidiu que sejam devolvidos dois carros de Kurt Paul Pickel apreendidos pela PF durante a operação, como provas dos crimes descritos no inquérito, por ordem do então juiz da 6ª Vara Federal Criminal, Fausto De Sanctis.

Foram apreendidos um Fiat Palio comprado em 1999 e um Chevrolet Vectra de 1997. As denúncias da operação Castelo de Areia, que atingiram Pickel, dizem respeito a fatos ocorridos em 2008. O juiz alega em sua sentença, proferida em 2009, que Pickel não apresentou provas de que os veículos foram comprados legalmente. Kurt Paul Pickel foi representado pelos advogados Alberto Zacharias Toron e Carla Domenico, do Toron, Torihara e Szafir Advogados.

Kurt Paul Pickel é acusado de ser um dos articuladores do que a PFsuspeitou ser um esquema de evasão de divisas. A denúncia, feita a partir da investigação da operação Castelo de Areia, era de que a construtora Camargo Corrêa estava envolvido em um plano de desvio de verbas públicas e lavagem de dinheiro, ao lado de partidos políticos. As provas colhidas durante a operação foram consideradas ilegais, e anuladas, pelo Superior Tribunal de Justiça.

Toda a investigação foi motivada por denúncias anônimas feitas à Polícia Federal e à 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo. A partir dessas denúncias, foram determinadas escutas telefônicas dos acusados e a acusação foi apresentada à Justiça pelo Ministério Público Federal. Mas a 6ª Turma do STJ decidiu que apenas denúncias anônimas não podem motivar a instalação de grampos – e a denúncia foi desqualificada por vício de origem.

Por conta da anulação, o TRF-3 não determinou que o processo volte à primeira instância, para nova instrução de provas – já que De Sanctis alegou falta de provas da legalidade da compra dos carros. Determinou que os carros fossem imediatamente restituídos, “tendo em vista a superveniência de fato novo”.

A relatora do caso, desembargadora federal Cecília Mello. afirma em seu voto que, como a sentença alegou falta de provas, o juiz deveria ter estabelecido o prazo de cinco dias para manifestação de Pickel. O procedimento está descrito no artigo 120, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal. Como houve a anulação da denúncia, a desembargadora opinou pela devolução dos carros.

O Ministério Público Federal foi da mesma opinião. Quando o caso chegou à segunda instância, opinou pela anulação da sentença e pela volta do caso à 6ª Vara Federal Criminal. Mas, também por conta da anulação da denúncia, emitiu parecer pedindo a devolução imediata dos veículos. Fonte: Conjur

Acórdão do TRF - 3ª Região:

Decisão do STJ que anulou a Operação Castelo de Areia:

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

NÃO EXISTE DELITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO, REFORÇOU O MINISTRO MARCO AURÉLIO, DO STF

Pedido de vista do ministro Luiz Fux adiou o julgamento, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), do Habeas Corpus (HC) 101798, impetrado em favor de J.R.G.F. e R.F.B. Eles foram denunciados pela prática do crime de lavagem de dinheiro (artigo 1º, incisos V e VII, da Lei 9.613/98).

Segundo o HC, com o recebimento da denúncia, uma ação penal contra eles está em curso na 6ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro. A defesa solicita ao Supremo o encerramento desta ação penal por falta de justa causa.

Consta da ação que os advogados impetraram habeas perante o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, alegando inépcia da denúncia e falta de justa causa para a ação penal, sob o argumento da impossibilidade de configuração do necessário crime antecedente do delito de lavagem de dinheiro.

O Tribunal Regional, conforme os autos, indeferiu a ordem porque a denúncia oferecida pelo Ministério Público “contém narrativa relacionada à existência de quadrilha organizada para o cometimento de delitos”. Além disso, o TRF-2 entendeu que essa organização criminosa está ligada à prática de crime de lavagem de dinheiro, tendo em vista que os denunciados retificaram declarações de rendimentos “exatamente para lavarem dinheiro decorrente de atividades de associação criminosa”.

Outra conclusão daquele tribunal teria sido a de que “a finalidade da lavagem de dinheiro é exatamente obter da Receita Federal a legitimação dos capitais amealhados, ainda que mediante artifício, sendo que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF informou operação atípica em relação ao nome da segunda paciente”. Por fim, o Tribunal Regional Federal entendeu que não é apenas aquele que pratica o crime antecedente que pode ser autor de lavagem de dinheiro, “mas também com ele respondem todos aqueles que, de alguma forma, concorrem para a conduta de dissimulação, emprestando nomes”.

Com os mesmos motivos, a defesa apresentou habeas ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) no qual a relatora indeferiu o pedido de liminar, por entender que o caso demandaria aprofundamento no exame do mérito. Contra essa decisão, foi impetrado o presente HC no Supremo. Nele, os impetrantes reiteram as teses sustentadas nas instâncias anteriores, solicitando o trancamento da ação penal por falta de justa causa.

Voto do relator

Para o relator do processo, ministro Marco Aurélio, os fundamentos do ato questionado servem para qualquer situação jurídica. “Na decisão, não se contém uma única linha a revelar o exame das peculiaridades do caso”, observou.

O crime previsto no artigo 1º da Lei 9.613/98 [lavagem de dinheiro], de acordo com o ministro Marco Aurélio, “pressupõe recursos decorrentes dos tipos constantes dos incisos”. Segundo ele, “sem o crime antecedente, enquadrável em um dos incisos do citado artigo, não cabe versar lavagem de dinheiro e tê-lo como configurado”.

Inicialmente, o relator excluiu a possibilidade de se cogitar que o tipo seja rotulado como “organização criminosa”. Isto porque, explicou, até o momento esse crime não foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro.

“Resta saber se a movimentação enquadrável no artigo 1º da Lei 9.613/98 decorreu de conduta tida como crime no sistema financeiro. Da leitura da denúncia, depreende-se que assim não ocorreu”, salientou o ministro. Conforme ele, o Ministério Público Federal (MPF) explicitou que os acusados requereram a retificação da declaração do imposto de renda com o objetivo de “dar contornos de legalidade a certo valor, depósito de R$ 500 mil”. A quantia seria fruto do jogo ilegal, de bingo, de jogo do bicho e de caça-níqueis.

“Ora, a prática do jogo ilegal não está prevista em qualquer dos incisos do artigo 1º da Lei 9.613/98”, analisou o relator. O ministro Marco Aurélio votou pela concessão da ordem para assentar que, no caso, inexiste justa causa para a persecução criminal. Fonte: STF

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

CURSO "CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - ASPECTOS MATERIAIS E PROCESSUAIS (2ª EDIÇÃO)"


Datas: 23, 24, 28, 29 e 30 de novembro e 01 de dezembro de 2011 (8 encontros)

Horário: 18:30 h às 21:00 h

Carga horária: 24h/aula

Realização e Local: Escola Superior de Advocacia da OAB/PE (Rua do Imperador, nº 307, 1º andar, Santo Antônio, Recife - PE)

Professores:

CARLOS BARROS - Advogado Criminalista; Professor de Processo Penal em cursos de Graduação e Pós-Graduação; Coordenador do Núcleo de Processo Penal da ESA-OAB/PE.
Carlos Eduardo Advogado Criminalista
ANDRÉ GOUVEIA - Advogado Criminalista; Professor de Direito Penal e Processual Penal na Faculdade Boa Viagem (FBV) e na Faculdade Joaquim Nabuco (FJN); Professor em cursos de Pós-Graduação; Professor de Crimes Contra a Ordem Tributária na ESAF.

Investimento:

R$ 100,00 (Advogados adimplentes e estudantes)

R$ 115,00 (Público em geral)


Informações: (81) 3224.7282 e (81) 3424.2423

terça-feira, 18 de outubro de 2011

CURSO "A NOVA DISCIPLINA DAS PRISÕES CAUTELARES E DA LIBERDADE PROVISÓRIA EM FACE DA LEI 12.403/11"

Datas: 07, 08, 09 e 10 de de novembro de 2011

Horário: 18:30 h às 21:00 h

Carga horária: 16h/aula

Realização e Local: Escola Superior de Advocacia da OAB/PE (Rua do Imperador, nº 307, 1º andar, Santo Antônio, Recife - PE)

Professor: CARLOS BARROS - Advogado Criminalista; Professor de Processo Penal em cursos de Graduação e Pós-Graduação; Coordenador do Núcleo de Processo Penal da ESA-OAB/PE.

Investimento:

R$ 70,00 (Advogados adimplentes e estudantes)

R$ 80,00 (Público em geral)


Maiores informações: 3224.7282 e 3224.2425

terça-feira, 20 de setembro de 2011

STJ DERRUBA MAIS UMA OPERAÇÃO POR ILEGALIDADES DA PF

Mais uma operação da Polícia Federal deflagrada com um show de fogos de artifício se transformou em um traque. Por unanimidade, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu anular, na última quinta-feira (15/9), todas as provas colhidas pela PF e pelo Ministério Público na chamada operação Boi Barrica, que investigou negócios do empresário Fernando Sarney e de outras pessoas da família do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

Os ministros consideraram que as quebras dos sigilos bancário, fiscal e telefônico dos investigados, e as escutas telefônicas que se seguiram a elas, foram feitas ao arrepio da lei e da Constituição Federal. Isso impediu que o mérito dos supostos crimes fosse sequer analisado. Com a decisão, já são três as operações espetaculares da Polícia Federal que não passam pelo crivo da legalidade no STJ, em um período de apenas cinco meses.

Em junho, a 5ª Turma do tribunal anulou as provas colhidas na operação Satiagraha. Os ministros entenderam que a participação oculta de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) na investigação comandada pelo então delegado Protógenes Queiroz, hoje deputado federal pelo PCdoB, foi ilegal. Dois meses antes, a 6ª Turma julgou ilegais as provas da operação Castelo de Areia, por ilegalidades semelhantes às que derrubaram, agora, a ação contra Fernando Sarney.

O STJ não reexamina provas nem entra no mérito do caso concreto, apenas verifica questões de direito. Mas em todos os casos os advogados apresentam evidências para desqualificar as investigações. No caso da Satiagraha, por exemplo, o que se sustenta é que a operação foi conduzida pela iniciativa privada. Tanto Protógenes Queiroz quanto Paulo Lacerda, ex-diretor da Abin, respondem a inquérito por corrupção passiva, interceptação ilegal de telefones e prevaricação.

O que motivou a investigação contra o filho do presidente do Senado foi uma comunicação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre uma movimentação atípica nas contas bancárias de Fernando Sarney e de sua mulher. O Coaf faz notificações sempre que detecta movimentações atípicas acima de R$ 100 mil. No caso do empresário, o Conselho chamou a atenção para uma movimentação de R$ 2 milhões.

Na própria notificação, o Coaf registrou que o fato não caracterizava necessariamente crime, mas que havia a necessidade de apurações complementares sobre a origem do dinheiro. De acordo com a decisão do STJ, a PF e o Ministério Público, diante da comunicação, pediram diretamente a quebra dos sigilos bancários, dados telefônicos e fiscais, sem qualquer fundamentação, exceto a comunicação de movimentação atípica.

Quebra irregular

Em sua decisão que autorizou a quebra dos sigilos, o juiz de primeira instância também não fundamentou os motivos das quebras. Segundo a decisão dos ministros do STJ, ele se limitou a reproduzir os argumentos do Ministério Público e afirmou supor que, com base em sua experiência, a notificação sugeria a ocorrência de crime. E determinou a abertura dos sigilos.

Diversas decisões do STJ e do Supremo Tribunal Federal já pacificaram o entendimento de que a quebra de sigilo tem de ter fortes motivos para ser decretada. Não pode ser o primeiro ato de uma investigação diante de uma denúncia anônima ou da comunicação de um fato estranho. Trocando em miúdos, sem investigações preliminares sobre um possível crime, não é legal quebrar o sigilo de investigados.

Ainda segundo a decisão do STJ, a Polícia Federal fez o pedido de quebra de sigilos cinco meses depois da notificação do Coaf, sem que tenha feito qualquer diligência para apurar mais indícios de crime neste período ou procurado ouvir explicações dos investigados. O MP ratificou o pedido e o juiz concedeu a quebra dos sigilos. Tudo diante da notificação do Coaf.

“A primeira ação de uma investigação não pode ser a quebra de sigilos ficais, bancários e telefônicos. Os sigilos têm proteção constitucional e sua quebra é medida excepcional, que deve ser tomada apenas quando não há outros meios possíveis para investigar um fato”, afirmou à revista Consultor Jurídico um ministro do STJ. E completou: “Ninguém está dizendo que não se pode investigar. A Polícia pode e deve investigar. Mas se a Constituição Federal exige fundamentação para a quebra de sigilos, não podemos aceitar essas quebras como a primeira medida das investigações”.

Ao decidir anular as provas, os ministros do STJ anotaram ainda o fato de a decisão de grampear os investigados, tomada depois da quebra dos sigilos por outro juiz, ter fundamentação idêntica à da que determinou a quebra de sigilos. O segundo juiz copiou até as virgulas da decisão do primeiro, que era baseada exclusivamente na notificação do Coaf.

O pedido de Habeas Corpus que gerou a anulação das provas foi feito por João Odilon Soares, funcionário de uma das empresas da família Sarney e sócio de outra, que também foi investigado pela PF. De acordo com as investigações, as escutas revelaram que Fernando Sarney tinha influência sobre a agenda do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, o que caracterizaria tráfico de influência. Segundo a PF, também foram encontrados indícios de desvio de dinheiro público.

O advogado Eduardo Ferrão, que defende Soares, afirmou que as investigações foram suspensas porque as decisões judiciais não estavam fundamentadas de acordo com os preceitos constitucionais. Logo, violaram a privacidade das partes envolvidas. “A simples comunicação do Coaf não justifica quebra de sigilo”, afirmou. De acordo com Ferrão, foram feitos 18 pedidos de prorrogação de grampo, o que deixou os investigados sob escuta por cerca de 7 meses sem que houvesse prova concreta do crime, o que caracteriza os grampos como invasão de privacidade. Ferrão ainda lembrou que o STJ anulou as provas, mas fez a ressalva de que as investigações teriam que continuar.

Preço dos erros

Os erros em investigações da Policia Federal já começaram render prejuízos à União. Reportagem da Folha de S.Paulo publicada na semana passada revelou que, desde 2007, o governo federal foi condenado a pagar pelo menos R$ 1,6 milhão em indenizações por danos morais ou materiais a pessoas que foram presas por engano, ilegalmente ou que foram submetidas a exposição midiática excessiva pela atuação da PF.

A mesma reportagem revelou que nas dez mais escandalosas operações patrocinadas pelo governo, a PF e o Ministério Público Federal colocaram 841 pessoas no banco dos réus, mas apenas nove (1,1%) foram condenadas definitivamente. Do total, só 55 (6,5%) sofreram algum tipo de condenação — a maioria teve a pena anulada ou recorre em liberdade.

Há vários exemplos de excessos que geraram indenizações. Reportagem da ConJur publicada em abril também mostrou que a Justiça Federal de Santa Catarina condenou a União a pagar R$ 50 mil de indenização por danos morais ao empresário Roberto Carlos Castagnaro, preso e acusado injustamente de lavagem de dinheiro e associação para o tráfico de drogas em 2006.

Na sentença que condenou a União, o juiz federal Nelson Gustavo Mesquita Ribeiro Alves observou que depois da exposição do acusado na imprensa, o Ministério Público pediu sua absolvição. “Apesar de toda a exposição midiática negativa sofrida pelo autor, o Ministério Público Federal não encontrou elementos probatórios da prática do crime de lavagem de dinheiro e pugnou pela sua absolvição”. Fonte - Conjur. Por Camila Ribeiro de Mendonça (repórter da revista Consultor Jurídico) e Rodrigo Haidar (correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília).

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA ATÉ R$ 10 MIL É CRIME DE BAGATELA

Crimes que envolvem débitos tributários – como o não recolhimento de contribuição previdenciária – em valores abaixo de R$ 10 mil são equivalentes a crimes de bagatela. Esse foi o fundamento de decisão unânime da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recurso do Ministério Público Federal (MPF) contra julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).

Dois réus foram denunciados por apropriação indébita de dez contribuições previdenciárias descontadas de seus empregados, entre os anos de 2002 e 2004, totalizando pouco mais de R$ 12 mil reais. Um dos réus foi absolvido e outro foi condenado à pena de dois anos e quatro meses de reclusão, em regime aberto, e multa. Posteriormente, a pena de reclusão foi substituída por prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária.

O MPF e o réu condenado apelaram ao TRF4, o primeiro pedindo também a condenação do corréu absolvido, o segundo defendendo a própria absolvição. O tribunal regional considerou que o valor remanescente da sonegação, que ainda não havia prescrito, somava cerca de R$ 6.800. Isso permitiria a aplicação do princípio da insignificância, com a consequente exclusão da tipicidade do delito – razão pela qual o TRF4 determinou a absolvição do réu anteriormente condenado.

No recurso ao STJ, o MPF afirmou que o artigo 168-A do Código Penal (CP), que trata do crime de apropriação indébita previdenciária, não estabelece valores mínimos, e que o fato de o Estado não promover a cobrança de débitos inferiores a R$ 2.500,00 não significa que não tenha interesse no recebimento dessas quantias. Além disso, mesmo que o limite para a aplicação do princípio da insignificância fosse de R$ 10 mil, as parcelas prescritas elevariam o valor apropriado indevidamente a mais de R$ 12 mil.

Entretanto, o ministro Gilson Dipp, relator do recurso, considerou que a jurisprudência já é pacífica no sentido de que o princípio da insignificância se aplica a situações em que os débitos tributários envolvidos não passem de R$ 10 mil. No caso, apontou, considera-se a hipótese do crime de bagatela, em decorrência do artigo 20 da Lei 10.522/02, conforme ficou decidido pela Terceira Seção do STJ ao julgar o REsp 1.112.748, no regime dos recursos repetitivos.

O magistrado disse ainda que, com a Lei 11.457/07, que incluiu os débitos relativos à contribuição previdenciária na dívida ativa da União, o mesmo raciocínio aplicado ao delito de descaminho, quanto à incidência do princípio da insignificância, deve ser adotado para o crime de não recolhimento das contribuições para a previdência social. Com essa fundamentação, o ministro Dipp negou o recurso do MPF. Fonte: STJ.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

DATA DE PARCELAMENTO DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO IMPEDE EXTINÇÃO DE AÇÃO PENAL

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve ação penal contra um empresário de São Paulo denunciado pelo crime de apropriação indébita de contribuições previdenciárias. A defesa do empresário pretendia obter habeas corpus para trancar a ação, alegando que, na época em que as parcelas deixaram de ser recolhidas, estava em vigor a Lei 9.249/95, que determinava a extinção da punibilidade se houvesse parcelamento do débito.

A empresa do réu, especializada em comércio e locação de equipamentos eletrônicos, foi autuada pelos fiscais da Previdência Social por não recolher contribuições em vários períodos, o últimos deles em 1998. O débito total, à época da autuação, chegava a quase R$ 30 mil, e os fiscais constataram que os valores das contribuições haviam sido descontados dos salários dos empregados. Essa situação é descrita no Código Penal como crime de apropriação indébita previdenciária.

Inicialmente, o empresário tentou trancar o andamento da ação penal com habeas corpus impetrado no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), alegando que a dívida com a Previdência já havia sido incluída em programa de parcelamento. Negado o pedido, recorreu ao STJ. Segundo a defesa, o parcelamento da dívida antes do recebimento da denúncia pela Justiça deveria levar à extinção da punibilidade, conforme previsto pela Lei 9.249, que estava em vigor quando ocorreram os fatos supostamente criminosos.

O ministro Og Fernandes, relator do caso, rebateu a tese da defesa. Ele observou que a Lei 9.964/00, que criou o Programa de Recuperação Fiscal (Refis), alterou o regime antes instituído pela Lei 9.249, ao determinar que, em vez da extinção da punibilidade, o ingresso em programa de parcelamento antes da denúncia criminal gera apenas a suspensão da pretensão punitiva do Estado. Só após o pagamento integral da dívida é que se extingue a punibilidade, de acordo com a lei do Refis. A suspensão da pretensão punitiva suspende também o prazo de prescrição.

De acordo com o relator, o parcelamento do débito da empresa do réu se deu em 27 de abril de 2000, quando já estava em vigor a Lei 9.964, publicada 17 dias antes, em 10 de abril. Por isso, segundo ele, é a lei nova que deve incidir no caso. O ministro já havia tratado de situação semelhante em outro julgamento, quando concluiu que deveria ser aplicada a regra legal vigente ao tempo da adesão ao parcelamento, “em nada interferindo a data dos débitos que originaram a acusação”.

“Após a edição da Lei 9.964, que instituiu o Refis, a extinção da punibilidade ficou condicionada ao pagamento integral do débito tributário ou da contribuição social”, afirmou Og Fernandes ao julgar o HC 37.541. “A adesão ao Refis implica a submissão às condições trazidas pela nova legislação, independentemente da época em que foram constituídos os débitos ensejadores da ação penal”, acrescentou, à época.

Entre outros precedentes do STJ, Og Fernandes citou o RHC 23.577, relatado pelo ministro Arnaldo Esteves Lima, para quem “não há falar em irretroatividade da lei mais gravosa, uma vez que o pedido de parcelamento do débito se deu durante a vigência da Lei 9.964, que, instituindo um novo regime de parcelamento, estabeleceu como consequência não mais a extinção da punibilidade, consoante previa a lei anterior, mas apenas a suspensão da pretensão punitiva e do prazo prescricional”.

No caso do empresário de São Paulo, a Justiça Federal de primeira instância informou que a ação penal já estava suspensa, em razão do que dispõe a lei do Refis. A decisão da Sexta Turma, rejeitando o recurso em habeas corpus, foi unânime. Fonte - STJ.

sábado, 30 de julho de 2011

EX-BANQUEIRO TEM PROCESSO ARQUIVADO PELA JUSTIÇA

A Justiça Federal rejeitou denúncia e mandou arquivar ação penal proposta pelo Ministério Público Estadual contra o ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira. A informação é do jornal O Estado de S. Paulo. O juiz Douglas Camarinha Gonzales, da 6ª Vara Criminal Federal em São Paulo, observou que os fatos atribuídos a Edemar — crimes tributários — na Justiça Estadual já tinham sido alvo de ação penal na instância federal que culminou com a condenação do ex-controlador do Banco Santos a 21 anos de reclusão.

"Vislumbro a existência de dupla imputação sobre os mesmos fatos, o que é vedado pela garantia do ne bis in idem", afirmou o juiz, invocando o artigo 5º da Constituição. "A garantia de que ninguém pode ser julgado mais de uma vez pelos mesmos fatos decorre da própria noção de segurança jurídica. Uma vez submetido ao processo penal, não é legítimo que continue a pesar sobre o cidadão, qual Espada de Dâmocles, a ameaça de nova persecução penal."

Camarinha destacou que a acusação do delito do artigo 7º da Lei 8137/90 (crimes contra a ordem tributária), segundo a qual Edemar e outros denunciados induziram tomadores de empréstimos a erro, também foi absorvida pelo delito de gestão fraudulenta. "Os fatos apontados repetem a acusação formulada e ainda em deliberação pela Justiça Federal", afirmou. Procurado, Edemar preferiu não comentar a decisão.

O processo que levou à falência do Banco Santos começou em 12 de novembro de 2004, quando o Banco Central decretou a intervenção na instituição financeira. Após descobrir que a situação financeira do banco vinha se deteriorando rapidamente e que o déficit patrimonial (diferença entre dívidas e os bens e créditos) seria de R$ 700 milhões, o BC afastou Edemar Cid Ferreira e então diretores do controle da instituição e nomeou Vanio César Aguiar como interventor.

Sua responsabilidade seria apurar possíveis irregularidades cometidas por dirigentes da instituição e levantar informações necessárias para que fosse decidido seu futuro.

Na época, os correntistas do banco tiveram saques limitados a R$ 20 mil para contas à vista e cadernetas de poupança. Os demais recursos ficariam bloqueados à espera de que fosse encontrada uma solução para a instituição financeira. Após a intervenção, no entanto, o BC recalculou o rombo na instituição e chegou à conclusão de que o déficit seria de R$ 2,2 bilhões, e não de R$ 700 milhões. Fonte - Conjur.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

PARCELAMENTO DE DÉBITO TRIBUTÁRIO SUSPENDE PRETENSÃO PUNITIVA E PRESCRIÇÃO

É correta a suspensão da pretensão punitiva – e, por consequência, do prazo de prescrição – contra pessoa física acusada de sonegação fiscal, quando firmado parcelamento do débito tributário. Esse foi o entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao analisar o caso de contribuinte acusada de redução do Imposto de Renda, com prestação de declarações falsas às autoridades fiscais ao omitir informação de ganhos na alienação de bens e direitos.

A contribuinte, que vinha sendo investigada por suspeita de crime tributário, obteve parcelamento do débito na Secretaria da Receita Federal, de acordo com o artigo 9º da Lei 10.684/03. Diante disso, o Ministério Público opinou pela suspensão da pretensão punitiva do Estado e também pela suspensão do prazo de prescrição do crime. Na primeira instância, o juízo da 12° Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal foi além e decidiu tornar extinta a punibilidade no caso.

O Ministério Público interpôs recurso para anular a decisão de primeira instância, sustentando que, durante o período em que a pessoa física estiver incluída no regime de parcelamento, tanto a pretensão punitiva quanto a prescrição devem ficar suspensas, porém não há motivo para a extinção da punibilidade, que só ocorrerá com o pagamento da última parcela do débito tributário.

O Tribunal Regional Federal da 1° Região (TRF1), ao julgar o recurso, determinou o regular andamento do procedimento investigatório e condicionou a eventual suspensão da pretensão punitiva à posterior propositura da ação penal. A defesa da contribuinte interpôs recurso no STJ, sustentando que não havia justa causa para a investigação, nem para a ação penal à qual ficou sujeita após o julgamento da segunda instância. Para a defesa, a decisão do TRF1 extrapolou o pedido do recurso, caracterizando julgamento extra petita.

A defesa pretendia impedir o prosseguimento do processo investigatório e suspender a pretensão punitiva, assim como o prazo de prescrição, alegando que o parcelamento firmado administrativamente estava sendo regularmente pago. Em seu parecer, o Ministério Público afirmou que, em casos similares, o Estado somente deve punir quando houver inadimplemento do contribuinte no refinanciamento da dívida.

A relatora do caso na Sexta Turma, ministra Maria Thereza de Assis Moura, reconheceu que houve julgamento extra petita e que a posição adotada pelo TRF1 divergiu do entendimento do STJ. Segundo ela, com o parcelamento do débito tributário, devem ser suspensas a pretensão punitiva e a prescrição do crime, “pois o escopo maior da norma penal é o pagamento do tributo”.

A ministra afirmou ainda que aguardar a decisão da administração tributária, à qual cabe fazer o lançamento definitivo, “não importa violação à independência das esferas administrativa e judiciária”. Com a decisão unânime, o procedimento investigatório foi suspenso até a quitação do parcelamento do débito concedido administrativamente. Fonte - STJ. Obs.: notícia referente ao HC 100954.

terça-feira, 26 de julho de 2011

SEMINÁRIO "A NOVA DISCIPLINA DAS PRISÕES CAUTELARES E DA LIBERDADE PROVISÓRIA EM FACE DA LEI 12.403/11"

Dia: 10/08/11

Hora: 18:30 h

Local: Auditório da OAB/PE (Rua do Imperador Pedro II, nº 235, Santo Antônio, Recife - PE)

Entrada franca

Realização: OAB/PE e Escola Superior de Advocacia da OAB/PE

Palestrantes:

  • BÓRIS TRINDADE – Advogado Criminalista
  • CARLOS BARROS – Advogado Criminalista e professor de Processo Penal em cursos de Graduação e Pós-Graduação


quarta-feira, 13 de julho de 2011

PENA EXAGERADA NÃO ACABA COM O CRIME ORGANIZADO

O combate ao crime organizado está em pauta. Tanto o Congresso Nacional quanto o Executivo preparam medidas para reformar leis e procedimentos que dizem respeito ao tema, o que parece salutar vez que o marco legal carece de modernização.

A questão é: qual modernização e para quem. O desmonte de estruturas criminosas organizadas não se faz pela previsão de penas exageradas, ou pela supressão de direito de defesa no processo penal. O enfrentamento do crime organizado será mais eficaz se as novas medidas sistematizarem o confuso marco legal, racionalizando a produção de provas e as atividades de investigação e modernizando os instrumentos de inteligência policial. Para dar um exemplo: a criação do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) foi mais importante para o combate à criminalidade econômica do que qualquer aumento de penas e sanções.

Algumas medidas importantes em discussão pelo Legislativo podem ser aprovadas ainda esse ano. Dentre elas, o projeto de lei que define crime organizado, cuja aprovação coloca uma pá de cal na eterna discussão sobre a existência ou não dessa figura no ordenamento jurídico brasileiro. A proposta ainda regulamenta atividades de investigação como a infiltração, e a ação controlada — estabelecendo limites para sua execução —, e define regras mais claras para adelação premiada, como a vedação expressa da participação do magistrado na elaboração do acordo entre o colaborador e o Ministério Público.

Também está em discussão a reordenação da Lei de Lavagem de Dinheiro, com propostas que merecem atenção, em especial a ampliação do rol de crimes antecedentes, que pode deixar de ser limitado e taxativo. Outro diploma cuja obsolescência é consensual e que deve ser revisto é a Lei 7.492/86, que trará à tona a discussão sobre a pertinência/impertinência de criminalizar algumas condutas como a evasão de divisas, com sugestões de transferir seu controle para o Direito Administrativo.

Por fim, é possível que sejam discutidas regras sobre a cooperação internacionalpara investigação, produção de provas e efetivação de atos judiciais no exterior ou a pedido de outros países. A falta de leis modernas sobre o tema torna confuso e complexo o auxílio mútuo, objeto de longas controvérsias jurídicas que poderiam ser superadas com um marco legal mais ordenado.

Enfim, há uma preocupação com a elaboração de normas mais claras e objetivas relacionadas ao crime organizado e ao delito econômico, que facilitem o trabalho dos atores processuais e contribuam para evitar as hoje constantes nulidades que prejudicam a defesa, a acusação e o próprio Judiciário.

A reforma legislativa, quando levada a cabo com cautela e reflexão, com a participação ativa dos diversos setores envolvidos, pode ser menos rápida e produzir menos efeitos simbólicos imediatos que a costumeira produção emergencial de leis penais, mas em geral oferece instrumentos bem mais efetivos para que sejam alcançadas as finalidades almejadas. A Lei 12.403/11, que trata das cautelares penais, é a mais recente e contundente prova disso.

Mensalão

Sem entrar no mérito do embate jurídico da Ação Penal 470, caso do mensalão, chamam atenção as várias centenas de anos de pena propostos pela acusação para alguns dos réus. No famoso caso do Massacre de Vigário Geral, quando policiais militares assassinaram 21 pessoas desarmadas em favela no Rio, e no Caso da Cavalaria, em que policiais mataram três meninos em São Vicente com espancamento e ocultação de cadáver, as penas foram inferiores a 60 anos.

Controvérsia

A mais contundente controvérsia sobre a Lei 12.403/11 (cautelares penais) gira em torno de sua extensão concreta. Há quem entenda que as novas medidas se limitam a substituir a prisão preventiva, ou seja, são aplicáveis apenas àqueles estão — ou deveriam estar — presos cautelarmente. Por outro lado, há quem defenda a extensão das novas medidas aos réus que aguardam julgamento em liberdade. Se o resultado da controvérsia pender para a segunda posição, serão ínfimos os impactos da nova lei na redução da crise penitenciária. Fonte: Conjur - Por Pierpaolo Cruz Bottini - advogado e professor de Direito Penal na USP. Foi membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e Secretário de Reforma do Judiciário, ambos do Ministério da Justiça.

domingo, 19 de junho de 2011

ADVOCACIA CRIMINAL EMPRESARIAL

Artigo de CARLOS BARROS publicado na Revista Advogados Mercado e Negócios ed. nº 30 – Maio/Junho de 2010


Sabe-se que, como conseqüência natural da atividade empresária, pessoas jurídicas dos mais diversos ramos de atuação se vêem, invariavelmente, às voltas com demandas de natureza cível, trabalhista e tributária. Em razão disso, natural, também, é a preocupação dos empresários e gestores em geral em manter uma assessoria jurídica constante nas referidas searas do Direito em favor de suas empresas.

Na atualidade, contudo, a experiência demonstra não mais se revelar seguro aos gestores empresariais focar a proteção de suas empresas, sob o aspecto jurídico, exclusivamente nas aludidas áreas do Direito, ante a incidência cada vez maior do Direito Penal nas atividades econômicas.

De fato, além de a produção legislativa voltar-se, cada vez mais, à criação dos chamados crimes societários, cuja responsabilidade pelo cometimento recai diretamente sobre os próprios gestores, a atuação dos Órgãos Policiais e do Ministério Público inclina-se, hoje, de maneira especial, para apuração dos ilícitos penais praticados por ocasião das mais variadas operações empresariais, realidade, inclusive, que é escancarada pela mídia diariamente.

Nesse contexto, portanto, valiosa se afigura uma assessoria jurídico-empresarial na área penal, em razão do que escritórios de advocacia criminal vêm se especializando numa ramificação do Direito Penal que a doutrina correlata e o próprio mercado da advocacia vêm reconhecendo e intitulando de Direito Penal Econômico.

Através de medidas preventivas desenvolvidas a partir de um trabalho de consultoria jurídica na seara criminal, pessoas jurídicas ou físicas com atuação nos diversos segmentos da economia podem evitar indesejadas demandas penais envolvendo delitos intimamente relacionados à atividade empresária, tais como crimes contra a ordem tributária, de sonegação fiscal, contra o sistema financeiro nacional, contra a economia popular, contra as relações de consumo, contra o mercado de capitais, contra a propriedade industrial e intelectual, crimes falimentares, de lavagem de dinheiro, de evasão de divisas, de apropriação indébita previdenciária, de concorrência desleal, de contrabando e descaminho, crimes licitatórios, ambientais, informáticos, dentre outros.

Nesse ponto, aliás, ressalte-se que, na maioria dos casos, o fator responsável pela efetiva incidência do Direito Penal sobre operações empresariais corriqueiras é justamente a carência de informação por parte de gestores e empregados.

Por outro lado, através de medidas ostensivas junto à justiça criminal, possibilita-se a empresas e pessoas jurídicas em geral a recuperação de passivos decorrentes de fraudes e outros crimes patrimoniais dos quais foram vítimas, sobretudo após a recente reforma pontual do Código de Processo Penal, quando se facultou ao Juiz fixar, na sentença penal condenatória, um valor a ser pago à vítima como reparação dos danos que lhe foram causados pela infração penal. E não se olvide, claro, a possibilidade de implementação de medidas legais no sentido de reprimir e combater a atuação devastadora da indústria da pirataria, que, por motivos óbvios, gera enormes prejuízos financeiros aos legítimos detentores de direitos sobre obras intelectuais, marcas e patentes.

De ver-se, longe de ser útil tão somente à criminalidade vulgarizada pelos veículos de comunicação – como equivocadamente acredita parcela da sociedade –, a advocacia criminal, mais do que nunca, se revela uma importantíssima aliada às sociedades empresárias e aos respectivos gestores, eis que representa um eficaz instrumento na proteção do patrimônio deles e, sobretudo, da liberdade dos próprios administradores, sobre quem os efeitos penais recaem diretamente, como já se alertou.

RESPOSTA À ACUSAÇÃO - CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E DE LAVAGEM DE DINHEIRO

Petição de CARLOS BARROS publicado na ed. número 5 (Nov/2010) da Revista Advocatus, editada pela Escola Superior de Advocacia da OAB/PE (ISSN 2177-3416)


EXMO. SR. DR. JUIZ FEDERAL DA xxxxxxx VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE PERNAMBUCO .





Ref. Proc. nº xxxxxxxxxxxx

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, por intermédio de seu advogado infra-assinado, porque instado a apresentar

RESPOSTA À ACUSAÇÃO

que lhe foi formulada perante esse Juízo, vem fazê-lo, nos termos dos arts. 396 e 396 - A do CPP, expondo e requerendo o seguinte:

Em que pese o recebimento da denúncia aviada pelo MPF, por meio da qual se imputa ao suplicante supostas infrações ao art. 1º, I, III e IV, da Lei 8.137/90 (crime contra a ordem tributária), e ao art. 1º, VII, da Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro), o caso, não há negar, é de absolvição sumária do suplicante, com esteio no art. 397, III, do CPP, eis que ATÍPICOS os fatos ali agitados.

E as atipicidades aqui delatadas, diga-se de logo, são constatadas sem maiores esforços, sendo desnecessárias, para demonstrá-las, análises aprofundadas sobre as figuras delitivas lançadas na inicial acusatória.

1ª Acusação: Art. 1º, I, III e IV, da Lei 8.137/90 – Inocorrência de lançamento definitivo do crédito tributário / Conseqüente inexistência de materialidade do suposto crime contra a ordem tributária / Atipicidade do fato / Hipótese de absolvição sumária

Em primeiro lugar, como é de sabença trivial, conforme estabelece a Súmula Vinculante 24 do STF,

“não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.

E, sendo assim, não resta dúvida de que a imputação feita ao suplicante de cometimento de crime contra a ordem tributária revela-se inviável, visto que não houve a constituição definitiva do crédito tributário decorrente da pretensa sonegação fiscal ventilada na denúncia, pelo que não há falar em materialidade do suposto delito em comento e, por conseguinte, em fato típico.

Tanto não houve o lançamento do crédito tributário que, nos autos, não existe qualquer informação nesse sentido ou mesmo de que foi instaurado o competente procedimento administrativo junto à Receita Federal para se saber qual, efetivamente, seria o quantum devido em decorrência da suposta sonegação fiscal.

Inexistindo, portanto, materialidade do suposto crime contra a ordem tributária imputado ao suplicante (art. 1º, I, III e IV, da Lei 8.137/90), vez que sequer houve lançamento definitivo do suposto crédito tributário dele decorrente, resta flagrante a ATIPICIDADE do fato, revelando-se imperiosa, desenganadamente, a ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA do suplicante, que é o que se REQUER, de logo, com fincas no art. 397, III, do CPP.

2ª Acusação: Art. 1º, VII, da Lei 9.613/98 – Impossibilidade de configuração do crime de lavagem de dinheiro, ante a inexistência de crime antecedente / Atipicidade do fato / Hipótese de absolvição sumária

Ao depois, há que se observar que, também no tocante à acusação de infração ao art. 1º, VII, da Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro), o caso é de absolvição sumária do suplicante, por manifesta atipicidade do fato.

Eis o aludido tipo penal:

“Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

(...)

VII - praticado por organização criminosa.

(...)

Pena: reclusão de três a dez anos e multa”.

Ora, conforme se apreende de uma simples leitura do referido dispositivo, e como bem leciona Guilherme de Souza Nucci[1] acerca do delito em comento, “o tipo penal promove a ligação indispensável da conduta de ocultação ou dissimulação de bens em geral à proveniência criminosa dos mesmos”, ou, na dicção de Luiz Regis Prado[2], “é indispensável que esses bens, direitos ou valores sejam oriundos, direta ou indiretamente, da prática antecedente de um dos crimes consignados no rol fechado previsto pela Lei 9.613/1998”.

Ocorre, todavia, que, por evidente, não se pode dizer que a mencionada circunstância ocorreu no presente caso.

Afinal, aqui, como visto, não há falar na ocorrência (indispensável) de crime antecedente e, por conseguinte, em “proveniência criminosa” de quaisquer bens, direitos ou valores, vez que não existe, hoje, sequer materialidade do suposto crime contra a ordem tributária imputado ao apelante (art. 1º, I, III e IV, da Lei 8.137/90).

Desse modo, inexistindo quaisquer crimes antecedentes e, por via de conseqüência, “bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime, impossível se revela, no caso, a configuração do crime de lavagem de dinheiro, insculpido no art. 1º, VII, da Lei 9.613/98.

Ademais, não se pode olvidar que, segundo o MPF, os pretensos bens e valores objeto do suposto crime de lavagem de dinheiro seriam advindos de atividade de “organização criminosa”, já que indicou, na inicial acusatória, o inciso VII, do art. 1º, da Lei 9.613/98, como incidente no caso.

E, assim sendo, há que se observar que, segundo exortam Roberto Delmanto, Roberto Delmanto Jr. e Fábio Delmanto[3],

“embora a Lei 9.034/95, em seu art. 1º, defina e regule ‘meios de prova e procedimento investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo’, a rigor não há, até hoje, uma definição legal do que seja ‘organização criminosa’, o que, a nosso ver, torna inaplicável este inciso VII em face do postulado da taxatividade da lei penal (CP, art. 1º)”.

Dessa forma, seja por um motivo, seja por outro, de igual sorte se afigura imperiosa a ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA do suplicante com relação à imputação de infração ao art. 1º, VII, da Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro), por indisfarçável ATIPICIDADE do fato, que é o que se REQUER também aqui.

Preliminar – Nulidade ab initio da ação penal, ante a inépcia da denúncia

Agora, caso restem ultrapassados os pedidos de absolvição sumária acima formulados – o que não se acredita, verdadeiramente –, há que se observar que o processo em apreço está eivado de vício substancial, consistente na INÉPCIA DA DENÚNCIA por manifesta afronta à regra insculpida no art. 41 do CPP, pelo que, preliminarmente, argúi-se a NULIDADE AB INITIO DO PROCESSO.

É que, no que atine ao suplicante, a denúncia não descreveu o fato com todas as suas circunstâncias, como indispensável, tampouco individualizou a sua conduta, limitando-se a uma narrativa genérica e amorfa.

Realmente, a despeito de se ter imputado ao suplicante supostas práticas dos delitos desenhados no art. 1º, I, III e IV, da Lei 8.137/90 (crime contra a ordem tributária), e no art. 1º, VII, da Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro), o MP, na exordial, não descreveu quais teriam sido, concretamente, as condutas supostamente praticadas pelo suplicante que, por menor que fossem, seriam aptas a vestir os figurinos dos aludidos tipos penais.

Aliás, o caráter genérico de que se reveste a inicial acusatória resta patente na medida em que se observa que as “ações” delituosas ali (mal) delineadas são genericamente atribuídas ao “GRUPO denunciado, e NÃO a cada denunciado de per si, já que, segundo o MPF, o GRUPO criminoso emite notas ficais falsas (...), o GRUPO, via de regra, (...) ofertava e entregava quantias em espécie com o fito de evitar uma fiscalização mais detalhada (...), “a vileza do GRUPO não reside apenas na questão da burla do fisco estadual (...), “o lucro financeiro do GRUPO é tão grande (...) que o GRUPO já acumula riqueza vultuosa” etc.

Assim, sem indicar, objetiva e concretamente, uma conduta eventualmente praticada pelo suplicante apta a configurar os delitos que lhe foram imputados, bem como sem descrever o fato com todas as suas circunstâncias, a denúncia se esgota maculada pelo vício da inépcia, que, como se sabe, contamina o processo a partir do seu nascedouro.

Nesse sentido, é lapidar o acórdão da 6ª Turma do STJ proferido nos autos do HC 50.804/SP, com relatoria da Min. Maria Thereza de Assis Moura (julg. em 11/11/08, DJe 01/12/08), assim ementado, verbis:

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 1. INÉPCIA DA DENÚNCIA. DESCRIÇÃO INSUFICIENTE DOS FATOS. NULIDADE ABSOLUTA. OCORRÊNCIA. PREJUÍZO À AMPLA DEFESA FLAGRANTE. 2. CRIMES SOCIETÁRIOS. MERA QUALIDADE DE SÓCIO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE NEXO DE CAUSALIDADE MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. 3. ORDEM CONCEDIDA.

1. Não tendo sido expostos os fatos imputados à paciente de forma suficiente, em atendimento aos requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, e causando flagrante prejuízo à ampla defesa, é se reconhecer a nulidade absoluta da denúncia.

2. Mesmo em se tratando de crimes societários, é indispensável a indicação de uma conduta que se ligue minimamente ao resultado, não bastando a referência à condição de sócio, sob pena de responsabilização de caráter objetivo.

3. Ordem concedida para anular o processo, desde a denúncia, dando oportunidade para que outra seja proferida, com a adequada exposição do fato”.

No mesmo diapasão, a 5ª turma do SJT, ao julgar o RHC nº 19.219 - RJ, com relatoria do Min. Arnaldo Esteves Lima, decidiu, verbis:

“PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS . TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. MATERIALIDADE E AUTORIA. TIPICIDADE (FORMAL, NORMATIVA E SUBJETIVA). TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO TIPO. JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. DENÚNCIA INEPTA. RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA. INADMISSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.

1. Nos crimes societários, embora não se exija a descrição minuciosa da conduta de cada acusado, é necessário que haja a narrativa dos fatos delituosos, de sua suposta autoria, do vínculo de causalidade e do nexo de imputação, de maneira a permitir o exercício da ampla defesa.

3. Não há confundir narrativa genérica da conduta com imputação de responsabilidade penal objetiva.

4. Cabe ao órgão acusador, em sua peça inicial, a demonstração do vínculo, ainda que mínimo, entre o risco causado ao objeto penalmente tutelado e a conduta efetiva do denunciado na condição de sócio da empresa para que se possa dar início a ação penal com o recebimento da denúncia.

5. Recurso provido para, reconhecendo a inépcia da denúncia, anular a ação penal em relação ao paciente, sem prejuízo do oferecimento de nova denúncia em que haja a descrição mínima da sua efetiva participação”.

E, na mesma esteira, este outro julgado também da 5ª Turma do STJ, lavrado nos autos do HC 62.330 - SP, relatado pelo Min. Gilson Dipp, verbis:

“CRIMINAL. HC. DISPENSA DE LICITAÇÃO. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. CRIME SOCIETÁRIO. NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MÍNIMA DA RELAÇÃO DA PACIENTE COM OS FATOS DELITUOSOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. ORDEM CONCEDIDA.

I. Hipótese em que a paciente foi denunciada pela suposta prática de crime previsto na Lei de Licitações porque a empresa da qual seria sócia teria celebrado contrato com o Poder Público para a execução de obra sem a prévia observância do procedimento licitatório.

II. O entendimento desta Corte – no sentido de que, nos crimes societários, em que a autoria nem sempre se mostra claramente comprovada, a fumaça do bom direito deve ser abrandada, não se exigindo a descrição pormenorizada da conduta de cada agente –, não significa que o órgão acusatório possa deixar de estabelecer qualquer vínculo entre os denunciados e a empreitada criminosa a eles imputada.

III. O simples fato de ser sócio ou administrador de empresa não autoriza a instauração de processo criminal por crimes praticados no âmbito da sociedade, se não restar comprovado, ainda que com elementos a serem aprofundados no decorrer da ação penal, a mínima relação de causa e efeito entre as imputações e a sua função na empresa, sob pena de se reconhecer a responsabilidade penal objetiva.

IV.O contrato firmado pela empresa da qual a acusada seria sócia com a autarquia municipal, o qual seria a circunstância que, segundo a denúncia, caracterizaria a participação da paciente na empreitada supostamente criminosa, teria sido assinado por outro co-réu.

V. A inexistência absoluta de elementos hábeis a descrever a relação entre os fatos delituosos e a autoria ofende o princípio constitucional da ampla defesa, tornando inepta a denúncia.

VI. Precedentes do STF e do STJ.

VII. Deve ser determinado o trancamento da ação penal instaurada contra a paciente.

VIII. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator”.

De se ver, e como cediço, quando há pluralidade de acusados, como no caso, a regra para a feitura da proposta acusatória consiste em individualizar a ação de cada agente, sob pena de inépcia e conseqüente nulidade do feito por cerceamento de defesa, já que o réu se defende dos fatos que lhe foram imputados, e não do artigo de lei eleito na inicial.

Assim, constatado o vício da inicial, argúi-se a nulidade ab initio da ação penal, ante a inépcia da denúncia, por violar, data venia, a regra insculpida no art. 41 do CPP, pelo que REQUER seja o processo declarado nulo desde aquele ponto.

Requerimento de oitiva de testemunhas

De resto, considerando a remotíssima possibilidade de restarem ultrapassados os pedidos de absolvição sumária formulados, bem como a preliminar agitada – o que não se acredita, registre-se –, REQUER-SE sejam inquiridas as testemunhas indicadas no rol abaixo, as quais deverão ser intimadas na forma da lei:

1 – xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx;

2 – xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx;

3 – xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.

Nestes Termos,

Pede Deferimento.

Recife, 06 de setembro de 2010.

Carlos Barros

OAB/PE 24.468



[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 419.

[2] PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 412.

[3] DELMANTO, Roberto, DELMANTO JÚNIOR, Roberto, DELMANTO, Fábio. Leis penais especiais comentadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 558.

terça-feira, 14 de junho de 2011

MPF RECORRE DE ANULAÇÃO DE CASTELO DE AREIA

A Procuradoria-Geral da República apresentou Embargos de Declaração contra decisão da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que, no dia 5 de abril, anulou as provas da operação Castelo de Areia da Polícia Federal por considerar que denúncias anônimas não podem servir de base exclusiva para quebra de sigilo. O recurso cita decisões anteriores da corte no sentido de que a denúncia anônima pode ensejar investigação. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Para a PGR, o acórdão "toca questão de caráter eminentemente constitucional, porquanto o indevido trancamento de ação penal resulta no desprezo da garantia à devida e adequada prestação jurisdicional penal". A operação da PF investigou suposto esquema de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e doações ilegais para políticos.

Maria das Mercês Gordilho Aras, subprocuradora que assina os embargos, destaca que as representações da PF revelam que no início do inquérito a meta era a obtenção de informações especificamente sobre um doleiro. Na decisão, a ministra relatora Maria Thereza de Assis Moura considerou que o objetivo era a busca de informações sobre "todas as pessoas que com ele (doleiro) tiveram ou realizaram algum negócio".

A PGR alega que a PF não requisitou acesso indiscriminado ao banco de dados de empresas de telefonia, mas apenas às informações cadastrais do doleiro para verificação de denúncia. No voto, a relatora apontou "desconexão entre a medida cautelar de quebra do sigilo de dados de um sem-número de usuários do sistema de telefonia e a necessidade de comprovação inicial do teor da denúncia anônima".

A PGR pondera que não se confunde o pedido de quebra do sigilo de dados telefônicos com a quebra do sigilo de comunicações. Anota que o voto condutor do acórdão não é capaz de sustentar a tese de que as interceptações se lastrearam exclusivamente em denúncia anônima.

A relatora do caso no STJ, ministra Maria Thereza de Assis Moura, vai examinar o recurso. Ela poderá acolher ou não os argumentos da PGR, que planeja levar a demanda para a alçada do Supremo Tribunal Federal. Fonte - Conjur.

LEIA OS VOTOS DOS MINISTROS NO CASO DA SATIAGRAHA

"Não se trata de mais um caso rumoroso que ficou impune." Ao deixar isso claro, o desembargador convocado do Superior Tribunal de Justiça Adilson Macabu anulou as provas produzidas pela Operação Satiagraha da Polícia Federal e consequentemente a Ação Penal contra Daniel Dantas por corrupção ativa. Relator do Habeas Corpus apresentado pelo banqueiro e concedido pela 5ª Turma do STJ, o desembargador adotou a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, e considerou que as provas são ilícitas e contaminam todo o processo que as seguiu porque membros da Agência Brasileira de Inteligência e um investigador particular contratado pelo delegado afastado Protógenes Queiroz participaram da investigação.

Além de identificar desvio de poder na atuação da Abin, o ministro observou que na investigação foi contratado um ex-agente do Serviço Nacional de Informações para fazer atos próprios da Polícia Judiciária, "e, o que é mais grave, pago com verbas secretas, ou seja, dinheiro público, sem previsão legal para tanto".

O desembargador citou o artigo 144 da Constituição Federal e a Lei 9.883/1999, que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência e criou a Abin, para concluir que a atuação da agência "se limita às atividades de inteligência que tenham como finalidade precípua e única fornecer subsídios ao presidente da República nos assuntos de interesse nacional".

"Jamais presenciei, eminentes ministros, ao defrontar-me com um processo, tamanho descalabro e desrespeito a normas constitucionais intransponíveis e a preceitos legais", admitiu. Macabu foi seguido pelos ministros Napoleão Nunes Maia Filho e Jorge Mussi.

O relator definiu prova ilícita como "aquela obtida com violação de regra ou princípio constitucional". E disse que em, relação a elas, o Brasil adotou o sistema da inadmissibilidade das obtidas por meios ilícitos. "Ou seja, toda e qualquer prova nessa situação não poderia, em tese, sequer, ingressar nos autos (...) e, na hipótese de vir a acontecer, ela deve ser excluída".

Ele explicou que a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada consiste no entendimento de que se uma investigação tem origem ilícita, toda a prova que dela decorrer, mesmo que não ilícita em si, não poderá ser admitida, pois já estará contaminada. Apesar de reconhecer que a aplicabilidade da teoria é discutida no Direito nacional, o desembargador citou decisões do STF e do STJ que a adotam.

O ministro Gilson Dipp, seguido pela ministra Laurita Vaz, ambos em voto-vista, divergiram de Macabu quanto ao ponto central de sua decisão ao entenderem que a ilicitude das provas não foi provada, já que, apesar da vocação institucional da Abin ser o assessoramento ao presidente da República no interesse nacional, isso não proíbe seus agentes de participarem de outras atividades com outras instituições.

Até mesmo a contratação de terceiros, ex-funcionários ou não da administração pública não constitui, em si, "violação das prerrogativas da Polícia Judiciária exclusiva da Polícia Federal enquanto submetidos à orientação, controle ou direção do responsável pelo inquérito", acredita Dipp. De acordo com eles, para saber se a atividade da Abin excedeu seus limites constitucionais seria necessário avaliá-la miudamente, o que não cabe em sede de HC.

Os ministros vencidos entenderam ainda que mesmo que a ilicitude das provas pudesse ser identificada no HC, Dantas só pedia o reconhecimento da nulidade dos procedimentos de monitoramento telefônico, monitoramento telemático, e ação controlada. A análise da relação causa-efeito entre eles e a nulidade das investigações e ações penais só poderia ser analisada e decidida depois. Ou seja, para eles, o voto de Macabu foi além do pedido feito no HC.

Quanto à adoção da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, a ministra Laurita Vaz mencionou que há pacífica jurisprudência dos tribunais superiores de que "vencida a fase investigatória pré-processual, eventuais irregularidades — que podem ser apuradas de forma absolutamente separada, em esferas pertinentes — não contaminam a Ação Penal instaurada". O questionamento das provas deveria ter sido feito na instrução criminal, diz.

Princípios

O voto vencedor de Macabu se fundamentou na defesa dos princípios constitucionais da legalidade, devido processo legal e impessoalidade. Em respeito a eles, o desembargador disse que não se pode admitir que, "se corrobore com o direcionamento e, por que não dizer, com o complô, de uma investigação criminal que ultrapassou todos os limites legais, tornando-se, ouso dizer, uma querela pessoal para incriminar determinada pessoa, valendo-se, para tanto, do uso efetivo de agentes da Abin e até de um ex-servidor do finado SNI, por parte da autoridade administrativa, em induvidoso e inaceitável desvio de poder, maculando todo e qualquer ato administrativo ou investigativo praticado".

Nesse sentido, citou um artigo do constitucionalista Luís Roberto Barroso (Princípio da Legalidade, Delegações Legislativas, Poder Regulamentar, Repartição Constitucional das Competências Legislativas) no qual é dito que "a observância dos princípios processuais não significa a busca da impunidade e nem mesmo um incentivo à criminalidade. Se o Estado estiver devidamente aparelhado este conseguirá por meio de procedimentos lícitos produzir as provas necessárias que possam demonstrar a culpabilidade de um acusado, ainda que o crime praticado pelo infrator possa causar repulsa aos seus semelhantes em razão de preceitos éticos ou morais".

Macabu também mencionou o princípio da igualdade ao dizer que "se todos são iguais perante a lei (...), não se pode aceitar que uma investigação manipulada, realizada a lattere, discriminatória em sua essência e inspirada em interesses ilegítimos, tais como motivações políticas e eleitoreiras, possa gerar consequências desastrosas, atingindo a liberdade das pessoas e as garantias processuais, independentemente de quem esteja sendo processado e da natureza da infração penal atribuída ao paciente".

Ao votar, o desembargador relator citou que a investigação instaurada para averiguar os excessos cometidos pelo então delegado da PF Protógenes Queiroz, responsável pela operação, resultou na sua condenação por violação de sigilo funcional e fraude processual, pela 7ª Vara Criminal de São Paulo. Atualmente o processo aguarda julgamento de recurso pelo Supremo Tribunal Federal, sob relatoria da ministra Ellen Gracie.

Quanto ao uso das provas produzidas no Inquérito Policial e na Ação Penal contra Protógenes, na 7ª Vara, o ministro Dipp diz que o prevalecimento de tal prova emprestada "pressupõe a discussão por ambas as partes do seu teor e credibilidade, o que não ocorreu". De qualquer forma, lembra que o MPF afirmou naquela investigação que a atuação conjunta da PF com a Abin não violou a lei penal.

Dipp também observou que nem mesmo há certeza de que as interceptações e monitoramentos tidos por ilícitos foram feitos sem autorização judicial, e que toda a trama revelada pelas interceptações foi judicialmente confirmada por depoimentos de testemunhas colhidos em contraditório e respeitada a ampla defesa.

Incompetência

Dipp chamou atenção para a coexistência no TRF-3 de um HC e uma apelação contra a sentença que condenou Dantas por corrupção, com a mesma alegação do HC que estava sendo julgado pelo STJ. O ministro disse que essa concomitância "é logicamente incompatível com a ordem processual ao expor diferentes órgãos judiciais que vão examinar o mesmo caso concreto a possível ambiguidade, contradição ou equívoco".

Ele identificou, na atitude, "inescondível desprestígio das instâncias ordinárias e seus órgãos, a meu ver, com inevitável violação da organização jurisdicional que também tem fundamento constitucional". A gravidade da situação, ele explica, é que o uso do HC como substitutivo de recurso ordinário pode alcançar o interesse da outra parte sem a devida oportunidade de defesa e contraditório que tem o recurso.

A quo

A 5ª Turma do Tribunal Regional da 3ª Região havia rejeitado o pedido de Habeas Corpus do banqueiro. A negativa foi baseada no entendimento de que a participação da Abin nas investigações não foi provada, o compartilhamento de dados entre órgãos do Sistema Brasileiro de Inteligência é aceitável e as nulidades declaradas na fase pré-processual não contaminam a futura ação.

Dantas foi condenado pelo Juízo Federal da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo por corrupção ativa porque, supostamente, nos dias 18 e 23 de junho de 2008, em um restaurante na capital paulista, por ordem sua, duas pessoas ofereceram R$ 1 milhão ao delegado de Polícia Federal Victor Hugo para livrar o banqueiro e sua família de investigações da PF.

Tentativa

O Ministério Público Federal vai tentar reverter, ou no mínimo limitar, os efeitos da decisão do STJ. Da mesma forma pretende fazer com a decisão da 6ª Turma que anulou as provas da operação Castelo de Areia também da PF no dia 5 de abril. O fundamento desta decisão foi que denúncias anônimas não podem servir de base exclusiva para que a Justiça autorize a quebra de sigilo de dados de qualquer espécie, como informa o jornal Folha de S. Paulo.

O procurador da República Rodrigo de Grandis, responsável pelo caso da Satiagraha na primeira instância, diz que não houve ilegalidade na participação dos agentes da Abin, pois eles trabalharam sob coordenação da PF e em atividades secundárias.

Segundo ele, mesmo que a participação seja considerada ilegal pela Justiça, há inquéritos resultantes da Satiagraha que poderão continuar válidos. Ele diz que a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada não é absoluta e possui exceções no Código de Processo Penal: quando não há "nexo de causalidade" entre a prova considerada ilegal e as outras; e as apurações resultantes da prova ilegal poderiam ter sido feitas por meio de "fontes independentes", ou seja, começado a partir de meios de investigação lícitos. Por Gabriela Rocha – Fonte: Conjur

HC 149.250

Clique aqui para ler o voto do desembargador convocado Adilson Macabu: http://s.conjur.com.br/dl/macabu-satiagraha.pdf
Clique aqui para ler o voto do ministro Gilson Dipp: http://s.conjur.com.br/dl/dipp-satiagraha.pdf
Clique aqui para ler o voto da ministra Laurita Vaz: http://s.conjur.com.br/dl/laurita-vaz-satiagraha.pdf